quinta-feira, 9 de junho de 2011

Intervenção sobre a transferência

Escritos- 1951

Intervenção sobre a transferência.

Na experiência psicanalítica, o sujeito se constitui por um discurso que pode ser produzido pela simples presença do analista. Lacan coloca que “a psicanálise é uma experiência dialética, e essa noção deve prevalecer quando se formula a questão da natureza da transferência”p215.

O autor afirma que existe um temor por parte dos analistas em relação á verdade do que os pacientes falam sobre suas doenças. “Se Freud assumiu a responsabilidade...de nos mostrar que existem doenças que falam, e de nos fazer ouvir a verdade do que elas dizem, parece que essa verdade...inspira um temor crescente nos praticantes que perpetuam sua técnica” p.216.

O caso Dora, foi o primeiro caso em que Freud reconheceu o papel do analista.

Lacan, neste texto, fundamentará sua demonstração do caso Dora  por ele ser representante na experiência da transferência e ser o primeiro em que Freud reconheceu que o analista tem seu papel.

O caso Dora é exposto por Freud sob a forma de uma série de inversões dialéticas.
É a primeira vez que Freud usa o termo transferência.
"É por aí que tentaremos definir em termos de pura dialética a transferência chamada negativa no sujeito, como sendo uma operação do analista que a interpreta.”p.217.
Lacan coloca que Dora se torna um objeto de uma troca odiosa. Devida a relação de seu pai com a sra k, ela é oferecida ao Sr k. Seu pai, não percebe.
1)Primeiro desenvolvimento da verdade: Dora entrega-se á Freud, falando de suas lembranças com um rigor que contrasta com sua imprecisão biográfica que é própria da neurose.

1a) Primeira inversão dialética:
  
Freud diz á Dora: “Qual é sua própria parte na desordem de que você se queixa?” Então, aparece o segundo desenvolvimento da verdade.



2) Segundo desenvolvimento da verdade: Dora foi cúmplice e protetora vigilante para manter a relação dos amantes. Com seu silêncio, protegeu. Dora participou desta “corte”. Ela é objeto por parte do srk. “...a relação edipiana revela-se constituída em Dora por uma identificação com o pai, favorecida pela impotência sexual deste, aliás vivenciada por Dora como idêntica á preponderância de sua situação de fortuna”218-219.

“Essa identificação transparece, com efeito, em todos os sintomas conversivos apresentados por Dora, e sua descoberta dá início á eliminação de um grande número deles.”219.

Dora então de repente manifesta o ciúme da relação amorosa do pai. Que significa eliminar alguns sintoma e manifestar subitamente o ciúmes? O que tem haver?

2a) Segunda inversão dialética: Freud observa que não é o ciúme do objeto que prepondera, mas sim, que ele esconde um interesse pela pessoa do sujeito rival. Interesse esse, que se exprime de forma invertida. Daí, surge um terceiro desenvolvimento da verdade.



3) Terceiro desenvolvimento da verdade: O fascinado apego de Dora pela sra k. Pela sua maravilhosa brancura corporal, as confidências que ela ouve sobre a relação da sra k com o marido, trocas de amabilidades entre as duas, “como embaixatrizes mútuas de seus desejos junto ao pai de Dora.”p 219.

A pergunta então, é: Dora, se você se sente despossuída perante a sra k, como não lhe quer mal? Porque é tão leal á ela? Guarda o segredo. Com este segredo, vamos á terceira inversão dialética.

3a) Terceira inversão dialética: O valor de Sra k para Dora, o real valor deste objeto. O valor de um mistério, do mistério de sua feminilidade corporal. No segundo sonho esse mistério se evidencia. A imagem mais distante de sua infância que Dora alcança. A imagem dela chupando o dedo com o polegar esquerdo e com a mão direita puxando a orelha do irmão.

Lacan coloca que parece que esta, parece ser a matriz imaginária em que vieram desaguar todas as situações que Dora desenvolveu em sua vida. O autor continua dizendo que essa cena é uma ilustração da teoria que ainda surgiria em Freud dos automatismos de repetição. E que por essa cena, podemos tirar a medida do que siginificava para Dora mulher e homem.

“A mulher é o objeto impossível de separar de um desejo oral primitivo, e no qual é preciso, no entanto, que ela aprenda e reconhecer sua própria natureza genital. (é espantoso, aqui, que Freud não veja que a determinação da afonia, durante as ausências do Sr k, exprime o violento apelo da pulsão erótica oral no “enfim sós” com a sra k.”220.

Lacan postula que para ter o acesso do reconhecimento da feminilidade, seria preciso Dora a “assunção” de seu próprio corpo para que não fique despedaçada e constitua sintomas de conversão. Despedaçada no sentido do estádio do espelho.

Para se ter acesso ao corpo o único intermediário que ela teve foi a imagem original. Esta imagem original nos mostra que ela teve uma abertura para o objeto. Isto significa que o irmão (parceiro masculino) foi quem “permitiu” que Dora pudesse se alienar na alienação primordial. Esta alienação primordial é aquela em que o sujeito se reconhece como eu. Foi a diferença etária que permitiu isso.

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