segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Aquele que corre

Uma vez um corredor me disse: "gostaria de poder alcançar a condição de correr na velocidade 12km/h." O que ocorre é que esse sujeito teve um personal trainer que lhe transmitiu que para correr mais rápido o corredor deve alternar momentos na corrida entre rápido e moderado. Porém, o sujeito que corre falou: "quando eu corria na esteira, eu sabia a velocidade e como controlá-la. Sem esteira, não sei qual a minha velocidade. Mesmo que possua um daqueles aparelhos que calculam quanto correu, que velocidade, este saber, se dá somente após a corrida.
A questão que coloco é a seguinte: Como treinar para aumentar a velocidade da corrida sem a esteira? Como saber qual a velocidade?
A esteira, nos dá um molde, nos diz como estamos, quanto percorremos, qual a velocidade limite para nós...A esteira nos ensina sobre nossa resistência, possibilidades e limitações.
E na corrida da vida? Quem é a nossa esteira? Podem ser os pais, a babá, tios, avós. E quem nunca teve ou correu em uma esteira? Dito de outro modo? Quem nunca teve uma referência?
Pois bem, me parece que é exatamente o que ocorre neste século de uma maneira geral. Se tivemos um modelo, nos posicionaremos perante ele ou nos iludindo em um ideal que com certeza nunca, NUNCA será alcançado, ou teremos esta referência para irmos em outra direção.

Caso, o sujeito nunca tenha tido a chance de correr ou mesmo caminhar em uma esteira, como fica sua posição no mundo?
O que poderemos saber de nós se a primeira forma de saber de nós mesmos vem do outro? O bebê chora, alguma esteira mãe diz:"está com sono, com fome, triste, com frio." Nesse momento inicial é esse o saber. Isso é o básico. Ter tido uma esteira que dá palavras, nomes.
Partimos para a vida após um repertório mínimo de palavras.
O sujeito que diz: "se tivesse uma esteira, conseguiria correr mais rápido". Esse é o desejo dele.
Se ele tem este saber, se ele sabe que a esteira é um molde e ele sabe pois lhe foi dado, ele pode correr mais rápido por conta própria.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Saídas para o ser do século XXI

Porque um espaço para olhar? Olhar o quê?
Quando estamos envolvidos, misturados com algum saber, alguma verdade, não podemos olhar. Para olhar, precisa de uma distância e consequentemente de um espaço, de uma separação. Acontece que muitas vezes precisamos de uma verdade para nos estruturarmos, temos interesses, necessitamos de uma garantia de que o caminho que percorremos está "correto". Neste caso, não há lugar para questões. Aí que mora o engodo de nós, seres desamparados pela condição humana.
Que acontece quando nos separamos de uma verdade absoluta e instauramos uma dúvida, uma pergunta, um pensamento que procuramos rejeitar?
Angústia. Vivemos em uma época em que não devemos ter angústias. Temos que ser felizes, capazes, eficientes e perfeitos. Este é o ideal do século XXI.
Porém, em nosso íntimo, sabemos que não existem garantias. Não sabemos. Não sabemos quando morreremos, como. Sabemos que o fim é certo.
Perdas são certas, reais. Perdemos pais, amigos,filhos, trabalhos, diversões. Perdemos.
A questão que se impõe é a seguinte: gastar energia dando conta da ilusão de ter garantia ou refletir e trabalhar psiquicamente como lidamos com nossas perdas?
Estar alienado, misturado significa de certa maneira estar no mundo na forma: Eu sou o outro. Já que somos um, eu sou o outro.
Separar, dói. Porém, nos liberta de nossa radicalidade. Nos leva para a vida. A vida que propicia riscos e escolhas. A vida que revela a responsabilidade de nosso gozo, de nossa posição, nosso lugar, nossa topologia.
Perdemos, mas não nos perdemos com nossas perdas. Ao contrário, é aí que nos encontramos simbolizando o que o objeto perdido representou.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Século XXI

Século XXI. Século marcado pelo excesso. Excesso de informações, de violência, de fracassos escolares, de mortes seguidas de homicídios, seguidas de catástrofes naturais, excesso no consumo... excessos.
O excesso demonstra que algo está sobrando, que tem um a mais. Vivemos a falta da falta. A falta parece não existir neste além da conta.
Coloco: Quais as consequências psíquicas da incidência do social, do que vivemos em sociedade em relação á falta?
O que nos impõe o excesso de informações? De que servem? Que saber se trata?
E os fracassos escolares? Não seriam uma forma de dizer que algo vai mal e muito mal?
Como podemos dar conta do que queremos se este século, parece estar marcado pela não falta. Ou seja, se não há falta, não há o desejo.
Que espaço nos resta para desejar?
A clínica psicanalítica não seria um dispositivo "anti social" que instaura uma falta?

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

AlienaçãoXSeparação

Dançar. Quem dança na vida? Que metáfora a dança nos proporciona?
Dançar, envolve contato com a música,com o corpo, com a relação com o espaço, com o outro, com o peso do corpo. O contato com a música nos coloca em relação ao ritmo e consequentemente a uma matemática e simultaneamente com uma expressão que se manifesta no movimento.
O dançar implica necessariamente um saber corporal do mais básico ao simbólico. O objetivo pode ser se distrair, brincar ou expressar o que se quer.
A dança africana, necessariamente exige um contato via olhar com o outro. Dança-se só, porém é fundamental a relação com o outro, que se dá via olhar, toque, ir na referência do outro, o outro ir na sua referência. É uma troca, não é só algo que se basta por si mesmo.
Partindo dessas considerações, coloco alguma questões referentes ao olhar psicanalítico:
1)A possibilidade de ouvir a música, pode indicar o quanto o sujeito que dança se separa dele próprio para "incorporar" sua interpretação do que ouviu. Posteriormente ele terá que expressar sua interpretação.
2)Saber do corpo. Que saber se trata? Para sabermos aonde estão os ombros, até onde vão os braços, como se colocar no espaço, precisamos saber até onde vamos, o que temos e onde temos. Sabendo isso, sabemos do nosso lugar topológico. Que metafórico!
3)Olhar o outro. Muitas vezes quando somos o outro não temos como olhá-lo. Olhar envolve separação e saber até onde vai um, até onde vai o outro. Isso significa que precisamos de um espaço, um lugar e um limite.
Proponho o debate em cima deste viés do simbólico, de que a dança traz consigo, algo de metafórico, de dialético, que diz respeito ás operações de alienação e separação. Um tema que pode se abrir é a questão da psicose. Com muita pretensão e non sense: Um tratamento possível da psicose via o dançar. Seria possível?